O seminário internacional, realizado hoje no Rio de Janeiro, foi uma iniciativa da FIESP, do BNDES e do CEBRI (Centro Brasileiro de Relações Internacionais) e teve na mesa de abertura o vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, a ministra da Gestão e Inovação, Esther Dweck, o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, o presidente da FIESP, Josué Gomes da Silva, e o presidente do conselho curador do CEBRI, José Pio Borges.
Palestrantes de renome como o prêmio Nobel, Joseph Stiglitz, e o prof. James Gailbraith (Lyndon B Johnson School of Public Affairs) expuseram sua visão sobre a coordenação de políticas fiscal e monetária como estratégias para o desenvolvimento sustentável. Mediados pelo economista e ex-presidente do BNDES, André Lara Resende, os painelistas falaram sobre a experiência internacional e os efeitos causados por diferentes formas de enfrentamento da inflação e do crescimento econômico pelo mundo, para uma plateia diversa, com parlamentares, professores de economia, ex-ministros de estado de diversos governos, jornalistas, convidados e empregados do BNDES.
Para o presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, o BNDES tem o papel histórico de propor o debate plural, complementar aos esforços de diversos setores do governo ao trazer reflexões sobre o desenvolvimento do país. Mercadante disse ainda que o cenário internacional tem três grandes tendências, que seriam a resiliência das cadeias industriais de valor no pós-pandemia; a revolução tecnológica, representada em parte por capacidade de produzir microchips e baterias de lítio, mobilidade elétrica, complexo da saúde e indústria 4.0; e, ainda, a emergência climática, com custo crescente dos desastres naturais.
“Precisamos fortalecer e reorganizar a defesa civil, vamos aprimorar as tecnologias no setor. Sobre a transição energética, o Nordeste é o ‘pré-sal’ da energia limpa, e o Brasil tem grande potencial de hidrogênio verde e etanol de 2ª geração. Precisamos rever o custo de financiamento. Não haverá futuro no mundo sem o Brasil”, ressalta o presidente do BNDES.
O vice-presidente Geraldo Alckmin, o presidente da Fiesp, Josué Gomes da Silva e a ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos Esther Dweck fizeram coro às críticas aos juros altos no país. Josué chegou a dizer que os juros estariam em níveis “pornográficos”, enquanto Alckmin lembrou da necessidade de se ampliar mercados e melhorar as bases para a expansão das exportações brasileiras, para desenvolver a indústria e gerar emprego e renda qualificadas no país.
Para Ester Dweck, estamos em um momento novo, de reconstrução e união. “O BNDES também é uma das grandes instituições brasileiras sendo reconstruída”. Nunca entendi por que o BNDES não teve uma participação ainda mais relevante durante a crise da pandemia”, declarou. Segundo a ministra, o Banco será um dos grandes motores do desenvolvimento brasileiro.
O economista Andre Lara Resende abriu o painel sobre a experiência internacional ao destacar que, a crise das economias avançadas em 2008 e, também, o pós-pandemia forçaram a revisão das teorias macroeconômicas. As políticas fiscal e monetária não podem mais ser concebidas como independentes. “Para retirar o país da estagnação, é necessário conceber que o Estado é parte do projeto, não há como suprimir o Estado, não existe capitalismo sem o Estado competente”, defendeu Lara Resende.
Em sua palestra, o vencedor do Nobel de Economia de 2001, Joseph Stiglitz, inicia com a lembrança de que, há cerca de 20 anos, a atitude frente à política industrial e bancos de desenvolvimento não era tão positiva como hoje. Segundo Stiglitz, há hoje consenso nos EUA entre os membros dos partidos Democrata e Republicano, da necessidade de uma política industrial que possa fazer frente à necessidade de se estabelecer o desenvolvimento da manufatura de microchips e promover a transição para uma economia verde.
Stiglitz lembra que, durante a pandemia do coronavírus, os EUA lançaram mão do War Act, instrumento para induzir a fabricação de produtos impactados pela escassez ocorrida no período de lockdowns mundo afora. “As ideias econômicas centrais nos últimos 40 anos estão sendo revistas e desacreditadas. A razão é que o crescimento esteve lento na era neoliberal e todos os benefícios gerados foram para as elites econômicas. Há 40 anos de evidências de que o neoliberalismo é segregador de riqueza.
O crescimento da desigualdade torna óbvio que é necessário alternativas às políticas monetárias. O Brasil tem sobrevivido apesar da sentença de morte. Isso porque o Brasil tem bancos de desenvolvimento que proveram juros baixos”, explicou o economista.
Joseph Stiglitz acrescentou que se o Brasil tivesse uma política mais razoável estaria em melhor estado macroeconômico. “É claro que juros altos afastam investimento e reduzem produtividade. O país é muito dependente de commodities e precisa de transição para uma economia (industrial) verde. Há forte teorias que demonstram – exemplo é a de Richard Nelson (Columbia University) – como quando se tem muito poder de mercado, como monopólios, aumentam-se dúvidas, riscos e inflação”, alerta o Nobel de economia. “Juros altos são contraproducentes pois podem levar a mais inflação, aumentam o custo da dívida pública e reduzem os recursos do governo para investimentos necessários ao crescimento econômico. Mesmo se pensar que pode ser por um problema fiscal, juros altos são contraproducentes”, concluiu.
O exemplo da Argentina foi citado por Stiglitz, em que reportou que o ministro da economia portenho, Martin Guzmán, persuadiu o Fundo Monetário Internacional, credor do país vizinho, a permitir que a Argentina crescesse, para reduzir a pobreza. “Juros altos e austeridade aumentam o problema fiscal enquanto taxas mais baixas podem aumentar a resiliência”, disse.
Sobre Bancos Centrais, Stiglitz ressaltou que BCs independentes não podem operar afastados de seus compromissos democráticos com a sociedade. Paul Volker, ex-presidente do FED (governos Carter e Reagan), dizia que o congresso americano criou o FED da mesma forma que poderia fechá-lo, segundo Stiglitz, numa demonstração de compromisso com o poder eleito. “Mesmo BCs independentes precisam ser mais representativos. Na Suécia, eles têm um membro representante dos trabalhadores. Aqui na América Latina, há exemplos do impedimento de pessoas do mercado financeiro serem membros da diretoria dos BCs, por conflito de interesses”, explicou.
Para finalizar, Stiglitz disse que o Brasil tem a sorte de ter um banco de desenvolvimento em bom funcionamento, como o BNDES, e que é um bom momento para repensar e trazer novas perspectivas. Afirmou ainda que a transição para economia verde tem colocado os bancos de desenvolvimento no centro da estratégia política.
O professor James Gailbraith destacou a questão principal do Brasil, hoje, são os juros altos. “A maior do mundo, para uma economia grande como essa, tem profundo efeito sobre a desigualdade, pois a agrava”, alerta.
Gailbraith acrescentou que uma política de juros excessivos tende a represar investimentos privados e aumentar o desemprego, o que acaba por desestimular o consumo. Para o professor, o desenvolvimento socioeconômico pode ser promovido no médio prazo com juros mais baixos, mas não apenas. Citando os exemplos do New Deal americano e da economia planejada da China, Gailbraith descreveu como os chineses concentraram investimentos em educação, saúde e infraestrutura, como forma de garantir urbanização de qualidade, com produtividade e preços baixos. “A China converteu a prosperidade do estado socialista em mercado de consumo, mas também, trouxe muitas ideias do Brasil. O Brasil poderia ter avançado mais com juros baixos, investimento alto e tributação mais justa”, esclareceu o professor da Lyndon B Johnson School of Public Affairs.
“O Brasil é um dos lugares mais seguros do mundo para o investimento estar, pois está melhor que muitos países da Europa. Tem uma estrutura financeira sólida, que protegeu bem o país na crise de 2008. Mas a política atual de juros altos precisa ser abandonada pois é insustentável, principalmente, com a crise climática”, concluiu.
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