Aprovada pelo Plenário na quinta-feira (17), na forma de um projeto de lei de conversão (PLV 7/2021), a desestatização da Eletrobras tem previsão de ser concluída no início de 2022, segundo os termos do relatório final da MP 1.031/2021.
A operação acionária de capitalização da empresa só ocorrerá após a transformação da MP em lei, mas o texto já permite ao Banco Nacional de Desenvolvimento Social e Econômico (BNDES) iniciar os estudos para a emissão das novas ações.
O texto incorporou 21 emendas de senadores e, por isso, precisará ser analisado novamente pela Câmara dos Deputados. A MP precisa ser aprovada em definitivo até até o dia 22, quando perde a validade.
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Eletrobras: modelo
O modelo de desestatização escolhido prevê a emissão de novas ações da Eletrobras, a serem vendidas no mercado sem a participação do governo, o que vai resultar na perda do controle acionário de voto mantido atualmente pela União e na remessa dos valores adquiridos diretamente para o caixa da empresa.
A União receberá bônus pelas outorgas das concessões de geração da Eletrobras. Essa forma de desestatização é a mesma sugerida pelo governo em projeto de lei enviado para o Congresso há dois anos, mas que não foi adiante (PL 5.877/2019).
Apesar de perder o controle da Eletrobras, a União terá uma ação de classe especial (golden share). Os acionistas até poderão ter mais que 10% do capital social/votante, mas não poderão exercer poder de voto acima de 10% do seu capital votante.
A golden share dá poder de veto para a União evitar a mudança dessa regra. De acordo com o texto aprovado, esse tipo de mecanismo poderá ser usado para a desestatização de outras empresas públicas.
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Proposta
O relator da proposta, senador Marcos Rogério (DEM-RO), defende em seu parecer que o modelo aumenta a eficiência e a concorrência no setor elétrico, permitindo a entrada de mais atores privados, ao mesmo tempo que salvaguarda os interesses do Estado e dos consumidores, mantendo a palavra final com a União. Mesmo após a capitalização, as garantias concedidas pela União à Eletrobras e às suas subsidiárias continuarão valendo para os contratos firmados anteriormente.
O texto aprovado também dá a possibilidade de que servidores da Eletrobras usem suas indenizações trabalhistas (em razão de eventual rescisão de contrato), para comprar ações da empresa no preço em que estavam cinco dias antes da publicação da MP — o que corresponde ao dia 18. A quantidade máxima de ações que podem ser compradas dessa forma está limitada a 1% do total. De acordo com o relator, isso foi previsto para evitar insegurança jurídica para os investidores da Eletrobras.
Trabalhadores da Eletrobras que forem demitidos nos 12 meses subsequentes à privatização terão direito a recolocação em outras empresas controladas pela União, em virtude de terem ingressado por meio de concurso público.
Subsídios
A MP prevê a extensão ou criação de subsídios da União para a conta de luz e a geração de energia sustentável. Uma das medidas é a prorrogação, por 20 anos, dos contratos do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa), que incentiva a participação de produtores autônomos no Sistema Elétrico Interligado Nacional. Os empreendimentos beneficiados têm base em fontes eólicas, pequenas centrais hidrelétricas e biomassa.
Outra regra estabelece que os aportes da Eletrobras na Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) sejam integralmente direcionados para reduzir a tarifa dos consumidores cativos (composto, na sua maioria, por unidades residenciais).
A CDE é um fundo setorial estabelecido em lei, e pago pelas empresas de distribuição, que tem como objetivo custear diversas políticas públicas do setor elétrico, como a universalização do serviço, a concessão de descontos tarifários a usuários de baixa renda e viabilizar a competitividade da energia produzida a partir de fontes não poluentes, entre outras. A CDE passará a receber recursos do excedente econômico da Usina de Itaipu.
A redução tarifária graças à destinação dada pelo projeto de conversão ao excedente econômico de Itaipu é calculada em 4,2% pelo Ministério de Minas e Energia, diz o relatório. A Eletrobras assumirá o risco hidrológico, absorvendo o encarecimento da energia elétrica nos momentos de escassez de chuvas.
Programas sociais
A Eletrobras também vai assumir uma série de programas de cunho social e ambiental. Alguns deles envolvem a revitalização das bacias hidrográficas dos rios São Francisco e Parnaíba, a garantia da navegabilidade dos rios Madeira e Tocantins e a revitalização das bacias na área de influência dos reservatórios das usinas hidrelétricas de Furnas. Esses programas terão comitês gestores presididos por indicados de ministros de Estado e prestarão contas ao Tribunal de Contas da União (TCU) e à Controladoria Geral da União (CGU).
Outras ações visam a redução do custo de energia elétrica na Amazônia Legal e a realocação de pessoas que habitam as proximidades de linhas de transmissão para moradias dignas e em locais de menor risco e insalubridade.
Os aportes de Eletrobras vão durar até 2033. A partir daí, os programas serão custeados através do excedente de recursos econômicos da Usina de Itaipu.
Termelétricas
Marcos Rogério manteve no texto uma intervenção da Câmara que estipula a contratação, pela União, de usinas termelétricas a gás natural para abastecimento de estados do interior nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. Essa medida foi considerada por muitos senadores como um “jabuti” — um trecho inserido em medida provisória que não tem relação com o propósito original dela.
O relator acrescentou, ainda, áreas da região Sudeste hoje atendidas pela Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e os estados sudestinos que são produtores de gás natural. No entanto, a versão do Senado removeu termo que condicionava a desestatização da Eletrobras à contratação das termelétricas. Segundo o projeto, essas usinas precisam ser instaladas nas regiões apontadas em locais onde hoje não existe fornecimento de gás natural.
Serão um total de 6.000 megawatts (MW) de energia provida pelas termelétricas ao longo de 15 anos, divididos assim: 1.000 MW na Região Nordeste, em regiões metropolitanas dos estados que não possuam na sua capital ponto de suprimento de gás natural; 2.000 MW na Região Norte, distribuídos nas capitais dos estados ou regiões metropolitanas onde seja viável a utilização das reservas provadas de gás natural nacional existentes na Região Amazônica; 2.000 MW na Região Centro-Oeste, nas capitais dos estados ou regiões metropolitanas que não possuam ponto de suprimento de gás natural; e 1.000 MW na Região Sudeste, sendo 50% para estados produtores de gás natural e 50% para estados não produtores de gás natural na área de atuação da Sudene.
Novas estatais
Outros dispositivos acrescentados pelos deputados e que foram questionados pelos senadores regulam leilões de energia e dispõem sobre obrigações das empresas estatais que precisarão ser criadas para a administração das usinas de Itaipu e de Angra dos Reis. O texto do projeto de lei de conversão autoriza o governo federal a criar uma empresa pública ou sociedade de economia mista para administrar a Eletronuclear (que controla as usinas de Angra, no Rio de Janeiro) e a Itaipu Binacional (PR). Por questões constitucionais, ambas não serão privatizadas: a Eletronuclear, devido ao monopólio da União sobre as atividades nucleares, estabelecido pela Constituição Federal; e a Itaipu Binacional, em razão de determinação do Tratado de Itaipu.
O projeto de conversão da Câmara determina que os próximos leilões de energia nova (empreendimentos ainda fora da rede) deverão destinar um mínimo de 50% da demanda declarada pelas distribuidoras à contratação de pequenas centrais hidrelétricas com potência de até 50 MW. Esse percentual será aplicado até se alcançar 2.000 MW. Após isso, o índice cai para 40% da demanda até 2026. Em seu relatório, o senador retirou do texto a obrigatoriedade de contratação de pequenas centrais hidrelétricas após atingir 2.000 MW.
Essas contratações serão por 20 anos e com preço máximo equivalente ao teto estabelecido no leilão para as pequenas hidrelétricas. O texto aprovado prevê ainda que nenhum estado poderá ter mais de 25% da capacidade total contratada.
A estatal a ser criada para gerir Itaipu e a Eletronuclear também fará a administração da conta do Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (Procel), poderá se associar ao Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (Cepel), manterá os direitos e obrigações do Proinfra e deverá gerir os contratos de financiamento que utilizaram recursos da Reserva Global de Reversão (RGR) celebrados quando a Eletrobras era responsável por essa reserva.
Em cinco anos, a nova empresa reembolsará a RGR com os pagamentos dos mutuários referentes à amortização, taxa de juros contratual e taxa de reserva de crédito.
Linhão
O texto garante a extensão do chamado “linhão” de Tucuruí, que distribui energia para regiões ao norte do Rio Amazonas, até Boa Vista. A obra, já em andamento, fará a conexão de Roraima com o Sistema Interligado Nacional (SIN). A obra foi contratada por meio de leilão em 2011, com conclusão prevista para 2015, o que não ocorreu. O motivo do impasse é que, do total de 721 quilômetros do traçado previsto para ser erguido, 125 quilômetros passam dentro da terra indígena Waimiri Atroari e há questionamentos ambientais. Diante do atraso da obra, a concessionária responsável pelo empreendimento acionou a Justiça, pedindo a rescisão do contrato.
ONS
O relator aceitou emenda do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, para que a nomeação dos dirigentes do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) seja feita após sabatina e aprovação do Senado. Marcos Rogério argumentou que, embora tenha sido instituído como entidade de direito privado, as atribuições do ONS são de uma autarquia.
Sedes
O texto proíbe da mudança das sedes de subsidiárias da Eletrobras (Chesf, Furnas, Eletronorte e CGT Eletrosul) e impede que elas sejam extintas, fundidas ou transferidas por até dez anos após a privatização. O relator argumenta que elas estão “fortemente ligadas” ao desenvolvimento das regiões onde atuam e um desmonte célere teria reflexos sociais e econômicos negativos.
Indenização
A versão do Senado acolhe um pedido para que o estado do Piauí seja indenizado em R$ 26,4 milhões pela venda da Companhia Energética do Piauí S.A. (Cepisa). Essa empresa foi incluída no Programa Nacional de Desestatização (PND) em 1997. Naquela oportunidade, a União autorizou a Eletrobras a adquirir o controle acionário da companhia, antecipou ao estado o valor de R$ 120 milhões pela transferência das ações. Ficou também acordado que o valor final da venda seria o apurado no leilão de privatização. O BNDES contratou então uma consultoria especializada que, para fins do leilão de privatização, avaliou o valor econômico mínimo da Cepisa em R$ 260,4 milhões. A União não realizou o leilão de privatização da Cepisa na época e o processo só veio a ser retomado no ano de 2016, porém com alterações nas condições de venda que depreciaram o valor das ações. (Ag. Senado).
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